«Apesar das imagens de Francisco como um dissidente, até
agora o acto mais revolucionário cometido por um Papa em 2013 veio de Bento XVI
sob a forma da sua impressionante decisão de renunciar voluntariamente ao seu
cargo. O facto às vezes perdido entre a loucura sobre Francisco é o facto de
que Bento é na verdade o principal responsável deste drama.
Bento, claro, nunca teve muita sorte no que toca às relações
públicas.
Ele entrou no cargo com uma narrativa pré-fabricada sobre
ser o "Rottweiler de Deus" e o "executor do Vaticano" e
nunca foi verdadeiramente capaz de se livrar disso. Em termos de opinião
pública, a diferença entre Bento e Francisco é talvez melhor mostrada assim:
Durante Bento, as pessoas assumiam que o que quer que não gostassem sobre a
Igreja era por causa do Papa; agora tendem a pensar que é apesar do Papa.
Como resultado, a tendência é caracterizar Bento e Francisco
quase como matéria e antimatéria - tradição vs. inovação, dogmatismo vs.
compaixão, etc. Independentemente do mérito discutível destas percepções, o que
elas ignoram é que Francisco não teria existido sem a decisão de Bento de se
pôr de lado.
Igualmente notável é o modo como ele lidou com a sua
partida. No seu último discurso aos cardeais em 28 de Fevereiro, Bento prometeu
"incondicional reverência e obediência" ao seu sucessor e tem mantido
a sua parte do acordo. Para além de uma carta privada enviada a um ateu
italiano que foi divulgada pelo receptor, Bento apenas foi visto ou ouvido em
público quando Francisco apareceu para o chamar ou convidar para algo.
Apesar dos rumores bem documentados entre alguns sobre a
nova direcção de Francisco, Bento não fez nada para encorajar uma
"oposição leal" ou para legitimizar dissidências ao novo regime.
Com efeito, Bento foi da infalibilidade à quase
invisibilidade, e inteiramente por escolha própria. Se isto não é um
"milagre de humildade numa era de vaidade", para invocar o elogio do
Elton John a Francisco na Vanity Fair em Junho, então é difícil de saber o que
será.
Num nível mais substancial, algumas das reformas pelas quais
Francisco está a receber crédito, incluindo a limpeza das finanças do Vaticano
e a sua política de "tolerância zero" aos abusos sexuais, acumulam
para a continuação das políticas que já começaram com Bento.
Mesmo se esse não fosse o caso, o ponto principal mantém-se
de que o "efeito Francisco" podia ter passado à história sem Bento a
dar o passo que nenhum Papa tinha dado em 600 anos -- e, dadas as
circunstâncias claramente diferentes, uma pessoa podia argumentar que é um
passo que nenhum Papa tinha dado desta forma.
Ninguém questiona isto, Francisco está a abanar a Igreja
Católica e a oferecer um novo sopro de vida. Para que conste, no entanto, ele
não foi o único dissidente, o único papa revolucionário de 2013».
John
L. Allen Jr
Fonte: Senza Pagare
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